Tuesday, November 19, 2024

Portugal Fashion encontra no Porto a fórmula mágica para combinar design, produção e distribuição

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Traduzido por

Helena OSORIO

Publicado em



20 de out. de 2023

Quando se pensa em ícones do urbanismo português, o elétrico, com a permissão das peças, ganha o jogo. Foi precisamente no Museu do Carro Elétrico do Porto que se realizou, de 10 a 14 de outubro, a 53.ª edição do Portugal Fashion, a Fashion Week da ‘capital’ do norte de Portugal. Mas o Portugal Fashion é mais do que uma sequência de desfiles e encenações vistosas, com o Douro ao fundo e pontes perfeitas de postais a ladeá-los. É uma iniciativa consolidada que procura ligar os três fundamentos da indústria da moda: design, produção e distribuição, colocando o conceito Made in Portugal no centro do discurso. Com toda a carga histórica e simbólica que, tal como os elétricos, essas três palavras carregam.

Um momento do desfile de Carolina Sobral no Portugal Fashion – Portugal Fashion

“Temos a indústria e uma posição geográfica estratégica. Temos um forte desenvolvimento em sustentabilidade e muitas marcas a optarem por produzir em Portugal. Temos uma grande plataforma para unir o design e a indústria”, afirmou Mónica Neto, diretora do Portugal Fashion, em conversa com a FashionNetwork.com.

Na sua 53.ª edição, a Porto Fashion Week deu forma a um programa em que as passerelles eram o centro das atenções, sim, mas que foi acompanhado de visitas às fábricas da zona (os arredores da cidade concentram o cinturão da produção têxtil portuguesa), bem como um showroom para apresentar aos compradores nacionais e internacionais os designs das empresas participantes e visitas, como a organizada aos escritórios criativos da Farfetch na manhã do dia 13 de outubro. Estas visitas mostraram, aos profissionais do setor, o contributo de Portugal para a indústria da moda, cada vez mais global, mas também mais ligada ao local.

“A meia hora do Porto há muitas fábricas e fornecedores têxteis. Mas a nossa plataforma procura ajudar os designers a serem globais, a pensar com eles como se internacionalizarem, onde devem estar, a que showroom devem ir connosco (o Portugal Fashion tem um acordo com a feira francesa Tranoï, um dos principais eventos do calendário parisiense) e em quais semanas de moda deveriam estar. Essa parte do negócio está sempre na nossa cabeça”, disse Neto, que lembra que o evento de moda é promovido pela Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE).

Do talento emergente à conexão com a moda africana

No que diz respeito a desfiles, o programa Portugal Fashion reuniu marcas emergentes apoiadas pela plataforma de jovens designers Bloom, como a House of Wildflowers, Andreia Reimão ou Ahcor, mas também marcas de renome no panorama português, como Carolina Sobral, Estelita Mendonça ou Luís Onofre, e talentos internacionais que escolheram o Porto como cidade para estabelecer as suas marcas. É o caso dos espanhóis David Catalán e Víctor Huarte (liderando não só a sua marca própria, mas também o design masculino da portuguesa Salsa Jeans) e da sul-africana Judy Sanderson.

“Até há alguns anos, as fábricas não sabiam dizer para quais marcas produziam. Mas agora são as empresas que orgulhosamente comunicam que os seus designs são feitos em Portugal. É o caso da Ganni, que tem muitas ligações com o país, por exemplo, e que é um parceiro industrial para fazer investimentos em sustentabilidade”, explicou Neto.

O que diferencia as indústrias portuguesas numa posição estratégica semelhante às espanholas? A diretora da Porto Fashion Week é claro: “A indústria portuguesa teve primeiro a visão da sustentabilidade. Com as novas regulamentações nesta matéria, todos os países têm de investir na sustentabilidade e fomos pioneiros.”

No caso do espanhol David Catalán, que lançou a sua marca em 2019, Portugal é a sua casa, tanto por motivos pessoais como profissionais. Depois de vencer o concurso Ego na passerelle de Madrid, optou por se instalar no Porto “pela facilidade de produção, tudo fica a meia hora de carro”. Além disso, o apoio da indústria aos jovens designers (mostra os seus designs na feira Tranoï e tem pontos de venda em Seul, Paris, Lisboa e Porto) e as encomendas mínimas aceitáveis ​​para marcas de assinatura são outras duas razões imperiosas para manter o seu negócio no país.

“E os certificados que retalhistas como a Zalando pedem são de produção portuguesa, na medida em que foram os primeiros”, acrescentou, alinhando-se com a gestão do Portugal Fashion na sua análise.

Uma das propostas da Wuman, uma das marcas africanas que marcou presença no Portugal Fashion através do programa Canex – Portugal Fashion

Olhando para o programa do desfile do Porto, a presença constante do slogan “Powered by Canex” surpreende. Estas palavras referem-se ao programa patrocinado pelo banco Afreximbank para promover a moda africana fora do continente. Às portas da pandemia, esta iniciativa coordenada por Lulu Shabell encontrou na plataforma Portugal Fashion o seu parceiro ideal para ganhar peso na Europa.

“Estruturámos esta aliança em torno de três eixos. Uma delas é a história, que construímos através dos desfiles dando visibilidade aos designers. A segunda é a capacidade de produção, que se articula com programas de mentoria e visitas a fábricas (no dia da inauguração do Portugal Fashion, os designers africanos convidados pela Canex deslocaram-se a centros de produção perto do Porto). Sabemos que um dos desafios em África são as infraestruturas e a cadeia produtiva, razão pela qual através desta colaboração os designers podem fabricar em Portugal. E o terceiro é o acesso ao mercado, que conseguimos graças a um acordo com a Tranoï”, destacou Lulu Shabell.

Poucos dias antes de aterrar no Porto, a coordenadora deste programa acompanhou uma seleção de designers africanos à edição de outubro da feira de Paris.

“Ainda não fechámos o relatório, mas em março de 2023 registámos vendas de 17 dos nossos designers no valor de cerca de 800 mil euros. Isto faz-nos perceber que existe um apetite pela moda africana. Para nós é importante vir para Portugal porque nos abre portas, dá-nos uma plataforma para nos darmos a conhecer, para ganharmos capacidade produtiva e para construirmos o caminho de acesso ao mercado”, precisou.

Obstáculos burocráticos

Apesar dos resultados (o Portugal Fashion reuniu neste mês de outubro 32 marcas, incluindo a dezena que veio da Canex, cerca de 20 compradores e cerca de 30 mil visitantes, por se tratar de um evento aberto ao público), o evento do Porto com moda está a passar por processos burocráticos e dificuldades. O evento é financiado por fundos europeus, “mas agora estamos numa transição do programa 2020 para outro chamado 2030”, observou Mónica Neto.

Desfile do espanhol David Catalán no Portugal Fashion – Portugal Fashion

“Estamos a aguardar desde outubro de 2022 uma nova convocatória de recursos. A questão é que teremos esse capital talvez no início do próximo ano, mas agora estamos com dificuldades em antecipar esses fundos. Para responder a esta necessidade temos procurado apoio em patrocinadores e noutras fontes de receitas, colaborando com consultores e perfis diversos que nos estão a ajudar a traçar uma estratégia não tão baseada em fundos europeus”, explica a diretora da passerelle.

“Esses programas têm muitas regras burocráticas, são projetados para construir estradas e prédios, não para financiar semanas de moda, por isso é difícil ser competitivo internacionalmente quando temos de enfrentar essas regulamentações”, acrescenta Neto.

“O Portugal Fashion também apoia designers em semanas de moda europeias como as de Paris, Milão ou Londres e esse programa está neste momento em pausa, o que está a afetar criativos portugueses como Marques’Almeida ou Ernest W. Baker”, acrescenta a direção, referindo-se a duas das empresas portuguesas que mais interesse despertam no panorama continental.

Apesar das adversidades, o Portugal Fashion afirma ser um ponto de encontro da moda portuguesa (e não só) no seu sentido mais lato. A moda como criatividade, mas também como indústria, como negócio, como ponte entre culturas, países e continentes.
 

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