Sylvie Santos nasceu em França e é filha de pais portugueses. Mudou-se para Portugal há sete anos para trabalhar numa mediadora imobiliária e é atualmente diretora do desenvolvimento territorial do grupo francês REALITES em Portugal. O grupo está sediado em Nantes desde 2003, tendo-se expandido para Marrocos, Senegal e, no final de 2022, Portugal. “Temos uma mina aqui”, diz em entrevista ao idealista/news, lamentando que os portugueses não se saibam “vender no mundo”. “Temos energias renováveis, indústria têxtil, calçado, gastronomia, clima, segurança… temos tudo”, acrescenta, sublinhando que quem “esteve no estrangeiro sabe dar valor ao país”.
Com cerca de 1.200 colaboradores, o grupo REALITES está focado em desenvolver soluções urbanísticas projetadas a pensar nas pessoas enquanto seus utilizadores, apostando na ligação entre usos inovadores e soluções imobiliárias. “Fornecemos soluções adequadas às necessidades dos territórios e dos habitantes, como as soluções aptas a alojar estudantes, famílias, idosos; soluções para a desertificação médica; desenvolvimento de novos espaços de trabalho ou de aprendizagem, etc.”, explica a empresa.
Em conversa com o idealista/news, Sylvie Santos conta como chegou ao grupo REALITES – “há cerca de ano e meio contactaram-se e fiz uma proposta para representar cá o grupo” – e adianta que já o conhecia muito bem: “Em França, é muito conhecido e não faz apenas promoção imobiliária residencial, faz também residências seniores e de estudantes, por exemplo, e tem até uma equipa feminina de andebol e voleibol. Vamos também abrir um orfanato. Gostava de o fazer em Portugal, mas será aos poucos. Apostei, quando entrei na REALITES, que a sede, ao fim de dez anos, será em Portugal [risos]”.
“O Estado tem imenso património devoluto, que façam uma parceria connosco. (…) Para mim seria uma honra. Só com os imóveis que a Santa Casa da Misericórdia e o Estado detém conseguiríamos ajudar a resolver o problema da habitação. Fazer parcerias público-privadas, esse será o caminho, e estamos cá para isso”
A paixão pelo país está sempre presente no discurso de Sylvie Santos, que considera que os portugueses deviam valorizar mais o país e as mais-valias do mesmo. Isto apesar de haver fatores menos positivos a apontar, como as burocracias, nomeadamente as relacionadas com os processos de licenciamento, a alta fiscalidade praticada no imobiliário e os baixos salários, que fazem com que muitos jovens qualificados sejam forçados a emigrar, como fizeram, no fundo, os seus pais.
“Quem olha de fora para Portugal sente que há aqui uma certa turbulência, instabilidade [política e legislativa]. Há muita gente que queria investir e está de pé atrás, à espera, e isto de certa forma afasta alguns investidores estrangeiros. Compreendo que se ponham travões, como por exemplo no Golden Visa e no regime de Residentes Não Habituais (RNH), mas que se deem incentivos. Há portugueses que também têm muito dinheiro, conheço pessoas que são proprietárias de prédios. Como solução, devíamos fazer uma reforma jurídica para dar mais segurança aos senhorios, às pessoas que querem arrendar casa. É preciso ajudar os empresários, eles criam empregos e pagam impostos, mas há que dar-lhes incentivos, não é só incentivar os estrangeiros. Há portugueses com dinheiro e a querer investir, até porque o imobiliário é sempre uma boa forma de investimento”, comenta a diretora do desenvolvimento territorial do grupo REALITES em Portugal.
Baixar o IVA na construção nova
À semelhança de outros ‘players’ do setor imobiliário, Sylvie Santos aponta o dedo à alta taxa de IVA praticada, que devia baixar na construção nova de forma a ser mais atrativo para os promotores imobiliários desenvolverem projetos residenciais, aumentando assim a oferta de casas: “O IVA teria de baixar para 6% na construção [nova], isso seria muito importante. É uma indústria que gera muto dinheiro. Em Espanha, por exemplo, estão a apostar muito no Build to Rent (BtR), e gostava de implementar cá este tipo de projetos. Mas a construir com IVA a 23% é complicado”.
Sobre a entrada em vigor do simplex dos licenciamentos urbanísticos (Decreto-Lei n.º 10/2024), a responsável mostra-se otimista, mas assegura que a melhor postura a ter é esperar para ver. “Acredito que vai melhorar, piorar também é difícil”.
De uma coisa diz não ter dúvidas, será necessário o setor público e o privado trabalharem em conjunto de forma a colocar mais casas no mercado: “O Estado tem imenso património devoluto, que façam uma parceria connosco. É algo que está previsto [no programa Mais Habitação], mas vamos ver o que vai acontecer. Para mim seria uma honra. Só com os imóveis que a Santa Casa da Misericórdia e o Estado detém conseguiríamos ajudar a resolver o problema da habitação. Fazer parcerias público-privadas, esse será o caminho, e estamos cá para isso”.
Carcavelos recebe o primeiro projeto do grupo REALITES
O primeiro projeto do grupo REALITES em Portugal acaba de sair do papel, adianta ao idealista/news Sylvie Santos. O Jardim Emidia, como se chama, está localizado em Carcavelos (Lisboa) e já começou a ser construído, prevendo-se que as obras demorem 18 meses. “São sete apartamentos e duas lojas, sendo que as lojas e dois apartamentos estão vendidos”, revela, lamentando os atrasos nos licenciamentos: “As coisas são muito lentas. Fizemos e escritura em fevereiro de 2023 já com o projeto aprovado e mesmo assim demorou um ano para começarem as obras. A burocracia é um grande problema”.
Em causa está um investimento de 1,2 milhões de euros, só na compra do imóvel, que será agora reabilitado. “Os preços da construção estão muito caros e queremos construir com muita qualidade. Para nós, o isolamento acústico e térmico é muito importante, temos muito cuidado com a forma de construir, sendo esta uma preocupação que o grupo tem em França”, assegura Sylvie Santos. Os preços começam nos 422.000 euros. “É complicado baixar, devido aos custos de construção”, argumenta.
Mais projetos (e investimentos) na calha
Segundo a responsável, o grupo REALITES tinha e tem muitos projetos em vista para Portugal, e de grande dimensão, mas prudência é palavra de ordem, pelo que há que “abrandar um pouco” e esperar para ver como tudo vai “evoluir nos próximos tempos”. Há, no entanto, um segundo projeto já na calha, esperando-se novidades sobre o mesmo a partir de março.
“Quero que os futuros projetos sejam também para portugueses, para que possam estar em casas dignas. Sobre o segundo projeto ainda não quero falar, mas será residencial-misto, com uma parte dedicada a coworking e/ou coliving. Será nos arredores de Lisboa. Aliás, os dois, três primeiros projetos serão nos arredores da capital, depois gostava de desenvolver no Porto, Alentejo e Algarve”, antecipa.
“Queremos crescer em Portugal e construir para os portugueses, para a classe média/média alta. Somos um grupo muito humano e estamos muito focados nas pessoas, naquilo que precisam”
De futuro, o desejo de Sylvie Santos passa por desenvolver “uma coisa muito maior”. “O meu sonho é fazer uma residência sénior com uma creche, mas não vai ser este ano. E a partir de agora vamos comprar terrenos e construir de raiz, penso que será mais fácil”. Sublinhando que “há muita falta de oferta” em Portugal no segmento das residências seniores e de estudantes, a responsável lembra que o grupo REALITES é especializado, em França, nestes nichos de mercado.
Quando questionada sobre quanto prevê o grupo francês investir em Portugal nos próximos cinco anos, aponta para a fasquia dos 10 milhões de euros. “Queremos crescer em Portugal e construir para os portugueses, para a classe média/média alta. Somos um grupo muito humano e estamos muito focados nas pessoas, naquilo que precisam”, remata.