Publicado em
26 de mar. de 2024
Nuno Gama apresentou no passado sábado, 23 de março, a sua nova coleção de verão intitulada “Luzboa”, no passeio ribeirinho de calçada à portuguesa que acompanha o Tejo até ao mar. Mais propriamente na zona onde contrastam obras arquitetónicas que simbolizam tempos distintos – como o MAAT e antiga Central Elétrica, a olharem a ponte sobre o rio encimada pelo Cristo Rei que também figurou em algumas peças do desfile. Como se Lisboa se transformasse numa espécie de Rio de Janeiro por cerca de meia hora, o que foi acentuado pelo tom inclusivo e estilo diversificado dos modelos profissionais à mistura com homens reais para todos os gostos. Tudo ao som da orquestra da GNR, com música especial de André Viamonte.
Nuno Gama faz assim tudo a preceito, e ainda melhor desde que se distanciou há duas estações da ModaLisboa, promovendo espaços icónicos de Lisboa e neste caso a luz mágica da capital portuguesa, até a acenar no nome da coleção para a primavera-verão 2024/25.
“Comme il faul” diriam os franceses e os portugueses aplaudem aquele que tem vindo a dar nova vida aos costumes e tradições lusos desde os anos 90, e sem esquecer ninguém. Até quem se foi aproximando de veleiro conquistado pela música. Como o próprio resume: “A minha eterna busca do português”.
“O rio ficou cheio de veleiros que ouviram a música e vieram assistir”, disse Nuno Gama à FashionNetwork.com, a meio dum sorriso lido no próprio tom de voz. “O local onde se instala o MAAT é representativo de toda a arquitetura portuguesa. O rio Tejo, a ponte, o Padrão dos Descobrimentos, os Jerónimos, a Torre de Belém, são vários ícones muito nossos”.
“O facto da própria estrutura do MAAT ter uma escadaria que se abre como uma espécie de anfiteatro permitiu que os modelos desfilassem pela linha do rio.”
Foram 78 looks masculinos que se seguiram em 25 minutos, o tempo que lhes foi autorizado para esta paragem em frente ao rio que resultou num grande abraço não apenas a convidados do couturier mas todos aqueles que se foram juntando à festa sem restrições. Como não acontece na ModaLisboa mais elitista e reservada cada vez mais a alguns, apesar de ser apoiada quase a 100% pela Câmara Municipal de Lisboa.
Esta acaba por ser também uma mensagem de confraternização e consolo de que a moda é de todos e para todos, não obstante a idade, a cor, o género, a forma.
“A intenção é exatamente essa: recuperar a individualidade e clientes que não estavam satisfeitos”, confessa-nos respondendo ao porquê de se ter distanciado da ModaLisboa há duas estações. “Foi o que tentamos na temporada anterior e repetimos desta vez ainda com mais força e mais adesão. No castelo chovia quase torrencialmente e agora fomos brindados com um dia fantástico de sol”.
“Estamos numa crise económica, cada vez mais se nota o desaparecimento da classe média e isso reflete-se nas vendas”, explica melhor. “A vida está cada vez mais cara, cada vez há mais impostos. O dinheiro está nas mãos do Estado Português, mas a grande maioria dos portugueses não tem poder de compra, salvo raras exceções”, desabafa ainda à FashionNetwork.com.
“Não está fácil a nível de produção com a mão-de-obra caríssima, por isso subimos a fasquia”, continua. “Evoluímos assim nas matérias-primas, por exemplo nesta estação temos peças em patchwork que são mais caras mas atingem um público com poder de compra mais elevado”.
“É uma experiência. Certa ou errada, vamos ver.”
“O mundo inteiro está virado às avessas, não só Portugal. É uma realidade mundial. A democratização não ajuda”, considera porém. “Tudo o que entra sem ser tachado não é justo para os europeus”.
“Os nossos queridos políticos não têm a noção da realidade. Fazer leis não chega, é preciso fazer sobreviver! E só estão a tirar partido da nossa ‘burrice’ e indiferença”, desabafa.
“A política tornou-se tão tecnocrata que os políticos não têm a noção dos problemas inerentes a cada profissão e, enquanto isso não for corrigido, o mundo não pode continuar.”
Para além do referido patchwork, a coleção “LuzBoa” apresenta “muitos algodões e linhos e muitos novos tecidos técnicos mais equilibrados a todos os níveis éticos e grau de sustentabilidade muito maior”.
Não faltaram fatos de banho (com um “sol” gráfico estampado de estreia), fatos clássicos, fatos de treino, T-shirts, sweats e calças safari com aqueles tons de pôr-de-sol e luar, etc., etc.; que emolduram a natureza, entre o desportivo, casual, sofisticado e até romântico, este último representado por peças com singelas florzinhas rendadas e aplicação das mesmas aqui e ali.
Em suma: um só homem Nuno Gama desdobrado nas suas múltiplas versões, virtudes, caráter, características e opções estéticas.
A paleta oscilou entre tons pastel, lilás, rosa, laranja, dourado ou preto, em contraste. Várias tipologias de chapéus como panamás, boinas ou até aqueles de cowboy. E ainda lenços, joias e calçado com a assinatura de Nuno Gama.
Não há nada que falte neste guarda-roupa masculino pronto para embarcar numa longa viagem de cruzeiro.
“A ser verdade que existe luz de Lisboa, como a luz do Porto não é igual e também tem influência sobre nós, mais uma vez tentei desenvolver e perceber a nova gente.”
Atualmente, Nuno Gama trabalha através do seu atelier junto ao Saldanha onde recebe à porta fechada e da loja online onde a maioria das peças deste desfile estará disponível já a partir de abril.
“Estamos a desenvolver alguns projetos em áreas diferentes para nós”, eventualmente “em hotéis” ou outros “espaços públicos” e “na decoração de alguma forma”, quis deixar em aberto, esperando pela surpresa acontecer.
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