Tuesday, November 19, 2024

“’Hotelização’ dos escritórios” ganha força em Portugal

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A pandemia mudou o paradigma do funcionamento do segmento de escritórios. As pessoas adotaram o teletrabalho e, mais recentemente, o regime híbrido. As empresas, por seu turno, adaptaram e/ou renovaram os seus espaços, de forma a serem mais atrativos. Cristina Machado, Head of Office Investment da consultora imobiliária Cushman & Wakefield (C&W), conta, em entrevista ao idealista/news, que a “qualidade média dos projetos de ‘fit-out’ dos ocupantes tem vindo a subir significativamente, num processo às vezes designado de ‘hotelização’ dos escritórios: tratar os colaboradores como hóspedes e não como trabalhadores”.

A especialista diz, de resto, não ter dúvidas de que “a centralidade, as acessibilidades e a qualidade do espaço são instrumentos fundamentais para atrair as pessoas de volta ao escritório”. 

Entre os temas abordados na entrevista está também a atratividade de Portugal enquanto destino de investimento imobiliário no segmento de escritórios. “(…) Os fatores que fazem Portugal ser um destino de eleição para a instalação de multinacionais mantêm-se e um bom exemplo é o facto de a nossa equipa de arrendamento de escritórios ter várias procuras de ocupação de escritórios ativas”, revela a responsável.

Haver estabilidade legislativa é, assegura Cristina Machado, crucial: “Tem um efeito muito positivo junto dos investidores internacionais, na medida em que dá a confiança que estes precisam para elegerem Portugal para alocação dos seus fundos num contexto de concorrência internacional”. 

Desde 2016 que está envolvida em operações imobiliárias de escritórios em Portugal, ocupando agora o cargo de Head of Office Investment da C&W. O que esperar do ano de 2024 no segmento de escritórios? Será mais animado que 2023?

O investimento no segmento de escritórios será provavelmente mais animado este ano do que em 2023, pois, com a perspetiva da manutenção ou até descida das taxas de juro em 2024, o sentimento dos investidores está a mudar face a todo o investimento em imobiliário. Adicionalmente, a atividade da ocupação dos escritórios em 2024 deverá voltar a estar perto dos valores médios verificados em anos anteriores, o que aumentará a confiança dos investidores em investir neste setor, já com uma maior visibilidade sobre o impacto do regime híbrido de trabalho.

Participou em transações emblemáticas como a venda do Edifício Sede do Novo Banco na Avenida da Liberdade ou a compra do Edifício Sede da Seguradora Tranquilidade. Há transações desta dimensão na calha?

Sim, acreditamos que será possível concluir transações com escala no setor de escritórios em 2024, sendo que uma das maiores e mais importantes até já se concretizou, nomeadamente a venda do projeto WellBe no Parque das Nações à Caixa Geral de Depósitos com o envolvimento da C&W. 

“A atividade da ocupação dos escritórios em 2024 deverá voltar a estar perto dos valores médios verificados em anos anteriores, o que aumentará a confiança dos investidores em investir neste setor, já com uma maior visibilidade sobre o impacto do regime híbrido de trabalho”

Além disso, a nossa empresa está envolvida em várias transações de investimento com dimensão e que, a concretizarem-se, contribuirão para que o volume de investimento em escritórios regresse a valores próximos dos últimos anos. 

Portugal mantém-se no radar dos investidores (portugueses e estrangeiros) no segmento de escritórios? O que os continua a atrair?

Claramente! Algumas capitais europeias tiveram um ajuste em preço dos seus ativos muito rápido e acentuado em 2022 e 2023, e durante algum tempo cidades como Lisboa ou Madrid pareceram relativamente caras. Esse processo de ajustamento está a terminar e, com a subida acentuada dos metros quadrados (m2) de ocupação de escritórios que se verificará ao longo deste ano (2024) em Portugal, os investidores serão novamente atraídos para o nosso mercado. 

Há novas empresas, nomeadamente multinacionais, interessadas em “entrar” no mercado nacional?

Absolutamente. Apesar do atual contexto internacional, os fatores que fazem Portugal ser um destino de eleição para a instalação de multinacionais mantêm-se e um bom exemplo é o facto de a nossa equipa de arrendamento de escritórios ter várias procuras de ocupação de escritórios ativas. 

É importante salientar que Portugal oferece uma mão de obra altamente qualificada, rácio qualidade/custo competitivo no contexto internacional e também um nível de infraestruturas que nos permite um fácil e rápido acesso a outras cidades europeias. 

“Apesar do atual contexto internacional, os fatores que fazem Portugal ser um destino de eleição para a instalação de multinacionais mantêm-se”

Depois dos anos de pandemia, que atrasou a tomada de decisão das empresas quanto à entrada em novos mercados, estas estão a concluir finalmente a sua política de regresso ao escritório – que julgo ser um fator essencial para o crescimento de qualquer negócio –, o que contribuirá para materializar a ocupação em edifícios no nosso país.

A falta de espaços grandes, com capacidade para acolher muitos trabalhadores, condiciona de certa forma a procura de escritórios? Há casos de grandes empresas que não se “mudaram” para Portugal por esse motivo? 

A maior determinante da procura de escritórios, atualmente, é a qualidade técnica do espaço e o seu nível de adesão às exigências Environmental, Social e Governance (ESG). Estão em construção alguns edifícios com as mais elevadas características de ESG, ideais para acolher os inquilinos mais exigentes. Não temos conhecimento de empresas que não se tenham estabelecido em Portugal pelas razões da pergunta, embora não possamos esquecer que as taxas de disponibilidade de escritórios em Portugal são bastante baixas, pelo que as alternativas à disposição dos ocupantes são limitadas.

A instabilidade política e o fim dos vistos gold e do regime de RNH, por exemplo, tiveram algum impacto no segmento de escritórios em Portugal? São fatores que contribuíram, de alguma forma, para que o ano de 2023 tivesse sido mais “morno” no setor?

Estes regimes especiais não são os que mais afetam o segmento de investimento comercial em escritórios de dimensão relevante, cujo mercado é maioritariamente coberto por investidores “institucionais”, ou seja, fundos de investimento, fundos de pensões, seguradoras, gestores de ativos, family offices, etc.

A pandemia trouxe muitas mudanças na forma como as empresas “olham” para os escritórios. De que forma o teletrabalho e o regime híbrido estão a influenciar o mercado de escritórios em Portugal?

É inegável o impacto que estas novas formas de trabalhar estão a ter no mercado de escritórios, mas esse efeito não é linear. 

“Por um lado, as empresas poderão precisar de menos postos de trabalho fixos, mas, por outro, as áreas dedicadas à colaboração e ao trabalho em equipa têm sido reforçadas. (…) As empresas estão cada vez mais conscientes da importância de ter as pessoas maioritariamente no escritório (…).

Por um lado, as empresas poderão precisar de menos postos de trabalho fixos, mas, por outro, as áreas dedicadas à colaboração e ao trabalho em equipa têm sido reforçadas. O efeito líquido de tudo isto não é tão significativo como muitas pessoas chegaram a pensar, e as empresas estão cada vez mais conscientes da importância de ter as pessoas maioritariamente no escritório. O novo paradigma ainda não está totalmente estabilizado.

O que está a mudar, em concreto, no setor? O que estão a fazer as empresas para tornarem os espaços de trabalho mais atrativos?

As empresas estão a reconhecer que a centralidade, as acessibilidades e a qualidade do espaço são instrumentos fundamentais para atrair as pessoas de volta ao escritório. A qualidade média dos projetos de ‘fit-out’ dos ocupantes tem vindo a subir significativamente, num processo às vezes designado de “hotelização” dos escritórios: tratar os colaboradores como hóspedes e não como trabalhadores.

“A qualidade média dos projetos de ‘fit-out’ dos ocupantes tem vindo a subir significativamente, num processo às vezes designado de ‘hotelização’ dos escritórios: tratar os colaboradores como hóspedes e não como trabalhadores”

O que pediria ao próximo Governo de forma a dinamizar o segmento de escritórios no país? O que seria crucial implementar/alterar para manter o setor “vivo”?   

A dinamização da economia deverá ser um dos objetivos principais do Governo e que sem dúvida irá diretamente contribuir para o desenvolvimento da atividade no setor de escritórios. No que concerne o investimento imobiliário, o mais importante é haver estabilidade de médio e longo prazo nas “regras do jogo” e, portanto, devem ser evitadas alterações frequentes às leis do arrendamento, fiscais, do IVA, entre outras. 

A estabilidade tem um efeito muito positivo junto dos investidores internacionais, na medida em que dá a confiança que estes precisam, para elegerem Portugal para alocação dos seus fundos num contexto de concorrência internacional. 

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