A nova representante de Portugal em Cantão, Ana Menezes Cordeiro, tem como principal objectivo “tornar mais visível” a marca Portugal em Guangdong. A diplomata, a primeira mulher portuguesa a assumir funções de cônsul-geral na China, defende que o projecto da Grande Baía pode permitir o reforço das ligações entre Portugal e o Sul da China
Texto Marta Melo
É A PRIMEIRA mulher a liderar um consulado de Portugal na China e mostra-se entusiasmada com as novas funções: “Ser diplomata em qualquer parte da China é fascinante, mas desempenhar funções de diplomata portuguesa em Cantão é particularmente inspirador”. Ana Menezes Cordeiro chegou em Setembro a Guangzhou, capital da província de Guangdong, cidade oficialmente denominada de Cantão pela diplomacia portuguesa. A responsável diz ter como grande prioridade “reforçar e tornar cada vez mais visível a presença de Portugal” na província, vizinha da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM).
“Decidimos ‘regressar’ a Cantão no século XXI, com a reabertura deste consulado em 2018. É uma nova página no relacionamento sino-português no Sul da China”, afirma a diplomata, salientando a importância de Guangdong. A província, sublinha, além da sua ligação ao comércio, acolhe muitas empresas e escritórios de representação de grandes conglomerados chineses e estrangeiros.
Com uma comunidade portuguesa residente de dimensão reduzida no âmbito da sua área de jurisdição – uma zona “nove vezes o tamanho de Portugal” e que engloba, além de Guangdong, as províncias de Hainan, Hunan e Fujian, e a Região Autónoma de Guangxi Zhuang –, a nova representante diplomática admite que a vertente económica e comercial tem um peso significativo nos trabalhos do Consulado-Geral de Portugal em Cantão. “Temos trabalhado activamente para aumentar as trocas económicas e comerciais entre Portugal e o Sul da China e promover os contactos entre empresas e empresários dos dois lados”, afirma a cônsul-geral em entrevista.
Apesar da importância do lado económico na acção do consulado, a representante portuguesa salienta também o contributo das áreas da educação, língua, cultura, saúde e turismo para a cooperação bilateral entre a China e Portugal.
Grande Baía com “potencial”
Com o projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau a ganhar cada vez mais relevância no contexto do Sul da China, Ana Menezes Cordeiro acredita que a iniciativa apresenta “grande potencial para o desenvolvimento e reforço do investimento e comércio entre Portugal e a China”.
A área da Grande Baía é “uma das mais dinâmicas no mundo”, nas palavras da diplomata, e oferece “várias oportunidades”. “Espero que as empresas portuguesas possam contribuir para o ambiente da inovação tecnológica na Grande Baía”, refere.
Com uma presença significativa no Sul da China em sectores tradicionais, como o alimentar e bebidas, os componentes automóveis, os têxteis e a cortiça, a ambição de Portugal é alargar a sua esfera de influência na região. Segundo Ana Menezes Cordeiro, o objectivo passa por trazer “a experiência e conhecimento dos portugueses” em domínios como o turismo ou a indústria farmacêutica, mas igualmente nas áreas dos componentes para inteligência artificial e das cidades inteligentes. O interesse de Portugal estende-se igualmente a sectores como o comércio electrónico, plataformas de serviços de software e alta tecnologia ou indústrias verdes, acrescenta a diplomata.
Portugal pretende também reforçar a presença em Hengqin, no município de Zhuhai, vizinho da RAEM, aproveitando os acordos de cooperação entre Guangdong e Macau e os planos para utilizar a ilha como ponto de promoção da diversificação económica da RAEM. Considerando que a intenção das autoridades passa por atrair talentos de fora da China para trabalhar em Hengqin, Ana Menezes Cordeiro reconhece neste projecto “uma oportunidade para reforçar” o papel de Portugal na região.
Os contactos da diplomata vão já no sentido de promover o investimento. Ana Menezes Cordeiro dá conta de uma reunião recente com a Associação Comercial de Indústria de Importação, Exportação e Retalho Transfronteiriço entre Zhuhai e Macau, durante a qual o desenvolvimento de Hengqin foi abordado. “Poderá ser uma boa plataforma para a entrada de produtos portugueses” no mercado chinês, sugere a cônsul-geral, dando o exemplo de um restaurante de gastronomia portuguesa já a funcionar na ilha.
Portugal está também a procurar dar cartas no mercado do comércio electrónico, sobretudo no ramo alimentar. Está actualmente em curso uma iniciativa nas redes sociais chinesas – incluindo Weibo, WeChat e Xiaohongshu – com a participação de 29 “influenciadores digitais”, para dar a conhecer produtos portugueses aos consumidores da China. A aposta soma-se às já habituais promoções em cadeias de supermercado.
O objectivo da campanha digital é promover o sector alimentar, com foco no comércio electrónico, onde, sublinha Ana Menezes Cordeiro, a China representou, em 2020, metade das vendas a retalho de bens de consumo na internet em todo o mundo, com um volume de negócios avaliado em cerca de RMB9,8 biliões (aproximadamente MOP9,4 biliões). A campanha “Contos de Portugal” decorre até Abril e, segundo a diplomata, a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), a liderar a iniciativa, espera que esta chegue a “mais de 5,5 milhões de consumidores e profissionais da indústria”.
Quanto a grandes investimentos portugueses em Cantão, Ana Menezes Cordeiro menciona, sem adiantar detalhes, a abertura de uma loja de uma marca lusa, em fase de finalização. “Poderá ser um importante catalisador da ‘marca Portugal’ na região”, assinala.
A promoção de Portugal na China vai além do domínio económico. De acordo com a diplomata, para este ano está prevista a realização de várias acções culturais e de divulgação da língua portuguesa, se o “contexto sanitário” assim o permitir. Uma das iniciativas, a cargo da Universidade de Estudos Estrangeiros de Guangdong, será a realização de uma Semana da Língua Portuguesa, para promover o conhecimento das culturas lusófonas entre alunos e professores, evento apoiado pelo Consulado-Geral de Portugal em Cantão e pelos congéneres do Brasil e Angola.