Qual é a campanha que gostaria de ter feito?
Tantas, que às tantas estou na dúvida entre algumas da Guinness, Skittles, Axe, John Lewis, Playstation, Diesel, Cadbury’s e Canal Plus, mas escolho o filme publicitário The Epic Split para a Volvo Trucks.
Quais são as razões dessa escolha?
Adoro como num briefing que pretende vender a direção dinâmica com controlo de estabilidade nos camiões Volvo, alguém se lembrou da espargata do Van Damme, imagem mítica dele apoiado entre duas cadeiras. E viu naquela imagem dos anos 1980 a chave louca para uma nova demonstração ou ‘Live Test’, que é o nome da campanha da Volvo Trucks, na qual através de uma série de filmes publicitários são demonstradas as valências destes camiões.
Como num território não naturalmente muito criativo, de linguagem direta, para empresários e condutores profissionais, conseguiram ser simples, mas de forma tão divertida, eficaz e louca.
Outra coisa que admiro é a realização de Andreas Nilsson, que acrescentou à ideia um brilhantismo insuperável, no ritmo, nos tempos entre a voz do pensamento do Jean Claude e a revelação da espargata entre camiões em marcha-atrás em plano contínuo, com a banda sonora corajosa que se revela perfeita, da Enya, seguindo o formato atual de manobras ao vivo, bem ao estilo do que a Red Bull faz, ou de programas de televisão tipo o Top Gear, que o tornaram deliciosamente viral e que fizeram com que fosse replicado em ‘spoofs’, paródias e memes até à exaustão.
O que é que lhe chamou mais a atenção: o texto, a imagem, o protagonista ou outro aspeto do projeto e porquê?
O inusitado de rever o Van Damme, ao som de Enya e todo esse azeite se diluir numa ideia incrível e simples, numa estética bela e moderna, onde de repente já nada é azeite, mas sim, os melhores camiões do mundo e um dos melhores anúncios do universo.
Este projeto inspirou-o a nível criativo? Se sim, em quê e de que formas?
Como um goleador da Segunda Liga a ver os golos do Haaland, claro que me inspirou a acreditar que tudo é possível e que vale a pena lutar por detalhes que por vezes são essenciais, seja em que ideia for.
Se a espargata não pudesse ter sido feita com o próprio Van Damme, não era a mesma coisa. Aquela intro épica com outra voz ou com outra música, se de repente tivesse uma daquelas músicas baratinhas da biblioteca de sons do Audiojungle, não era a mesma coisa, pois não?
Qual é a campanha que fez que mais o concretizou profissionalmente? Porquê?
São já duas décadas de trabalho criado com muita gente incrível, em agências que gostei muito de trabalhar e, felizmente, tenho algumas campanhas que me concretizaram profissionalmente.
Como também felizmente ainda procuro sempre outras mais, aquela melhor ainda – porque é assim que tem de ser – não podemos ficar à sombra da nossa melhor campanha. E porque agora estou muito feliz na Dentsu Creative, escolho a campanha do Circuito.
Como é que chegou a esta ideia e avançou para a execução?
É uma campanha muito especial, nascida em plena pandemia, por causa do estado péssimo em que o mundo da música estava na altura. Um circuito de bares e salas de concerto fechadas sem data para reabrir, era mesmo uma questão de ‘ao vivo ou morto’, o conceito orelhudo inicial que fazia mesmo muito sentido quando tínhamos músicos e trabalhadores ligados à música a precisar do mais elementar: ganhar para comer e pagar a renda.
Nasceu a hashtag e a ideia de criar uma fila de protesto à porta de um local emblemático de concertos, como que à porta de um festival que não iria acontecer. Uma fila de simpatizantes pela causa, combinada com um ‘line-up’ de artistas que se juntaram, apresentados num filme nascido de muitos esforços e boa vontade, uma grande fogueira e muitos músicos, incluindo um dos seus realizadores, o João Marques da 78.
E um texto que me deu muito prazer em escrever. Veio do coração, com uma achega à então algo inerte ministra da Cultura. Palavras lidas por um ator que também é músico, o Pedro Laginha, que também vivia o que estava a ser lido.
E esse filme convidou à fila, a par dos posters #AoVivoOuMorto, que se quadruplicou em Lisboa, Porto, Viseu e Évora e muita gente juntou, cinco quilómetros de pessoas atrás de pessoas na então era das máscaras faciais que aos poucos conseguiram ter concertos de volta, nos bares e salas de espetáculos que se juntaram ao Circuito.
O que é que faz quando não tem ideias?
Não faço ideia. Agora a sério. Acho que é mais o que faço quando não tenho ‘boas’ ideias. Pensando um pouco, refletindo, há sempre ideias para qualquer necessidade. O problema é não chegar a nenhuma de jeito ou chegar a uma boa, mas já feita. Isso sim, ataca-nos com a força da síndrome de impostor, até que, se correr tudo na normalidade, lá surge uma boa ideia, original.
Às vezes surge ainda outra ideia, bem melhor, mas já depois de entregue a outra ideia, aprovada, o que a deixa sem tempo de acontecer e isso dói tanto como uma folha em branco. Também acontece. Faz parte de sermos humanos e não IA. Que ainda nunca vi ter uma boa ideia, já agora.
Ficha técnica
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