A compensação que algumas empresas pagam aos seus trabalhadores por despesas adicionais com o teletrabalho está isenta de descontos para IRS e Segurança Social até um determinado limite. A medida, em vigor desde 1 de outubro de 2023, junta-se às outras alterações à legislação laboral (de 1 de maio do mesmo ano), no âmbito da Agenda do Trabalho Digno. Entre elas, já constavam o alargamento do teletrabalho a pais com filhos com deficiência, doença crónica ou com doença oncológica.
De acordo com a portaria 292-A/2023, de 29 de setembro de 2023, não estão sujeitos a IRS nem contribuição para a Segurança Social as compensações diárias até ao limite de:
- 10 cêntimos, para consumo de eletricidade residencial;
- 40 cêntimos, para consumo de internet pessoal;
- 50 cêntimos para uso de computador pessoal ou equipamento informático equivalente.
Assim, no máximo, fica isenta de IRS e de Segurança Social a compensação paga pela entidade patronal até ao limite de 1 euro por dia. Se o valor da compensação for superior, já conta como rendimento do trabalhador, sujeito a descontos para IRS e Segurança Social
Estes limites máximos isentos de impostos sobem para 1,50 euros por dia no caso dos funcionários abrangidos por contrato coletivo de trabalho.
Quem tem direito a compensação de teletrabalho sem descontos
Só têm direito à isenção de descontos na compensação por teletrabalho os funcionários que cumpram um dia completo de trabalho à distância, através de recurso a tecnologia de informação e comunicação. Nestes casos, entende-se que “um dia completo de trabalho” tem de corresponder, no mínimo, a um sexto do horário semanal. Ou seja, se o funcionário cumprir um horário semanal de 40 horas, a isenção de descontos na compensação só se aplica se o teletrabalho decorrer durante, pelo menos, seis horas e 40 minutos.
Estas regras também só se aplicam se o pagamento de compensações por teletrabalho estiver previsto em acordo escrito entre trabalhador e entidade patronal.
A isenção de descontos na compensação implica ainda que a entidade empregadora não tenha fornecido computador, eletricidade ou internet ao trabalhador. Caso o trabalhador tenha recebido esses bens ou serviços da empresa, ou beneficie de descontos na sua aquisição, já não tem direito a isenção de descontos por eventuais compensações recebidas.
Teletrabalho com os mesmos direitos do presencial
O Código do Trabalho define teletrabalho como uma “prestação de trabalho em regime de subordinação jurídica do trabalhador a um empregador, em local não determinado por este, através do recurso a tecnologias de informação e comunicação”. Pode ser desempenhado por quem fizer parte da empresa ou por quem acaba de ser admitido já com esse regime.
Em ambos os casos, a possibilidade de prestação de trabalho neste regime à distância deve constar do contrato de trabalho ou de um acordo escrito que funcione como aditamento ao contrato. A falta deste documento pode complicar a prova, em caso de conflito entre as partes. Além disso, a portaria que define os limites da tributação de eventuais compensações também exige a existência de acordo para prestação de teletrabalho. Nada impede, contudo, que o local de trabalho definido no acordo inicial possa ser posteriormente alterado pelo trabalhador, mediante acordo escrito do empregador.
O teletrabalhador tem os mesmos direitos e deveres que os colegas com a mesma categoria ou função idêntica que se deslocam à empresa. Alguns exemplos: formação, promoções e progressão na carreira, limites do período normal de trabalho, momentos de descanso, reparação de danos por acidente de trabalho ou doença profissional e não pode receber menos do que receberia em regime presencial.
O empregador deve proporcionar formação adequada para as tecnologias de informação e comunicação a usar na atividade. Além disso, deve promover contactos regulares com a empresa e os colegas, para que o funcionário não se sinta isolado. Por regra, não deverá deixar passar mais de dois meses entre cada contacto.
O trabalhador tem de comparecer a reuniões de trabalho, formação ou outras atividades que exijam presença física, desde que seja avisado com, pelo menos, 24 horas de antecedência.
Privacidade dos trabalhadores deve ser respeitada
Quem presta serviço em regime de teletrabalho fá-lo, habitualmente, a partir de casa, o que levanta questões sobre a privacidade. É, desde logo, vedada a possibilidade de o empregador captar e utilizar imagem, som, escrita, histórico ou recurso a outros meios de controlo que possam afetar o direito à privacidade do trabalhador.
Tal como em regime presencial, quem presta serviço à distância deve ter um horário de trabalho definido. Fora deste horário, não poderá ser contactado pela empresa, a menos que exista um motivo de força maior, devidamente justificado. A entidade empregadora deve abster-se de contactar qualquer trabalhador no período de descanso, quer esteja ou não em teletrabalho.
A entidade patronal não pode esperar que o trabalhador esteja disponível 24 horas por dia, sete dias na semana. Pode visitá-lo para controlo da atividade e dos instrumentos de trabalho, mas com condições. As visitas só podem ser feitas durante o horário laboral, com pré-aviso de 24 horas e com o acordo do trabalhador.
A lei permite, ainda, que o empregador envie alguém responsável pela segurança no trabalho, a fim de verificar as condições em que é exercida a atividade. Mas, também aqui, existem regras: a visita só pode ocorrer das 09h00 às 19h00, num período acordado com o trabalhador e no horário de trabalho. Se por exemplo, o dia de trabalho terminar às 17h00, a deslocação não pode decorrer entre as 17h00 e as 19 horas.
Computador e net a cargo da empresa
Cabe ao empregador disponibilizar todos os equipamentos e sistemas necessários à atividade. O acordo de teletrabalho deve indicar se os mesmos são fornecidos diretamente pela empresa ou se o trabalhador pode adquiri-los e apresentar as despesas. Deverá também explicitar que utilização pode ser feita desse equipamento. Contudo, não pode proibir o uso das tecnologias de comunicação e informação em reuniões convocadas por estruturas representativas dos trabalhadores, como comissões de trabalhadores ou sindicais.
Todos os custos associados ao teletrabalho, incluindo acréscimos no custo da energia e da rede de internet, devem ser pagos pela entidade patronal. O mesmo se aplica às despesas relativas à manutenção dos equipamentos e sistemas. Este género de compensações não é considerado rendimento do trabalho, incluindo para efeitos fiscais, desde que não ultrapasse os limites fixados na portaria.
Teletrabalho com subsídio de alimentação
Em princípio, deve manter-se o pagamento do subsídio de alimentação. O trabalhador continua a estar ao serviço da entidade patronal e a ter despesas com a sua alimentação. Ainda assim, a lei não é clara relativamente a esta questão, mas indica que o teletrabalhador não deve receber menos do que receberia em regime presencial.
No entanto, também deve ser tido em conta o que consta dos contratos de trabalho, de eventuais instrumentos coletivos de trabalho ou até de regras em vigor na empresa e que tenham sido aceites pelos trabalhadores. Se estiver estabelecido que o subsídio apenas é devido quando o trabalhador se desloca às instalações da empresa ou a outro local por esta determinado, então é legítimo que o subsídio de alimentação deixe de ser pago.
O pagamento do subsídio de refeição não é obrigatório, embora a prática, na quase totalidade das entidades empregadoras, é a de existência desse subsídio.
O subsídio de transporte, pela sua natureza, pode não ser pago. Não há deslocação, e o trabalhador não tem de suportar qualquer despesa.
Seguro de acidentes de trabalho
Os trabalhadores que se encontrem a trabalhar a partir de casa continuam cobertos pelo seguro de acidentes de trabalho. Se o trabalhador se encontrar a desempenhar a sua atividade em regime de trabalho remoto e sofrer um acidente, deverá ser compensado pela seguradora, desde que o que lhe sucedeu seja enquadrável como acidente de trabalho.
Para evitar constrangimentos, é recomendável que as entidades empregadoras formalizem junto da seguradora esse regime. Para tal, devem indicar, em relação a todos os trabalhadores que se encontram abrangidos por esta situação de exceção:
- nome do trabalhador;
- período normal de trabalho (datas e horas autorizadas);
- local de trabalho (morada onde vai ser prestado);
- e a autorização prévia dada pela entidade patronal.
E o que pode ser considerado um acidente de trabalho? É todo aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho. Por local de trabalho entende-se o lugar em que o trabalhador se encontra ou deva dirigir-se em virtude do seu trabalho e em que esteja, direta ou indiretamente, sujeito ao controlo do empregador.
Por sua vez, o tempo de trabalho, além do período normal de laboração, inclui igualmente o que preceder o seu início, em atos de preparação ou com ele relacionados, e o que se lhe seguir, em atos também com ele relacionados, e ainda as interrupções normais ou forçosas de trabalho. Estando o trabalhador em casa, qualquer incidente que se verifique dentro do horário de trabalho, ou no que o antecede em tarefas de preparação ou conclusão, poderá ser considerado um acidente de trabalho.
Trabalho remoto por tempo determinado ou indeterminado
O teletrabalho pode ter duração determinada ou indeterminada, ou seja, ficar ou não definido à partida quanto tempo durará. Nos primeiros 30 dias, tanto a empresa como o trabalhador podem pôr fim a este tipo de regime. Se determinada, a duração não pode exceder seis meses, havendo renovação automática por igual período, desde que nenhuma das partes declare o contrário, por escrito, até 15 dias antes da data da mesma.
Quando não tenha duração determinada, qualquer das partes pode fazer cessar esta forma de prestação do trabalho. Para tal, deve avisar a outra parte, por escrito, com 60 dias de antecedência. Terminado o regime de teletrabalho, o trabalhador retoma as tarefas nas instalações do empregador ou noutras com ele acordadas.
A quem não pode ser recusado o teletrabalho?
Em regra, o regime de teletrabalho exige o acordo entre empregador e trabalhador. No entanto, há situações em que o primeiro não pode opor-se ao pedido do segundo, desde que o trabalho remoto seja compatível com as suas funções e a entidade patronal disponha de meios para o implementar.
1. Trabalhadores que necessitem de cuidar dos filhos até três ou oito anos
Quem tem crianças até três anos pode ficar a trabalhar em casa. Este direito é extensível até aos oito anos da criança – exceto para funcionários de empresas até dez trabalhadores –, no caso das famílias monoparentais. Nos agregados com dois progenitores, se só um tiver funções compatíveis com teletrabalho, pode pedi-lo. Já se ambos puderem desempenhar as funções à distância, só terão direito a esse regime se o repartirem entre si, em períodos iguais, tendo como referência máxima 12 meses. Por exemplo, fica o pai em teletrabalho três ou seis meses, a mãe, no trimestre ou semestre seguintes e assim sucessivamente.
Têm também direito ao teletrabalho os trabalhadores com filho portador de deficiência, doença crónica ou oncológica que com eles residam, independentemente da idade do filho.
2. Vítimas de violência doméstica
As vítimas de violência doméstica representam outra das situações excecionais. Podem exigir ficar em teletrabalho nos casos em que apresentaram queixa contra o agressor e tiveram de sair da casa. É uma forma de evitar que este, provavelmente conhecedor do local habitual de trabalho da vítima, insista nas práticas violentas.
3. Cuidadores informais não principais
Os trabalhadores a quem tenha sido reconhecido, pela Segurança Social, o estatuto de cuidador informal não principal podem solicitar o regime de teletrabalho por um período máximo de quatro anos, seguidos ou não. Para tal, a lei exige que o referido estatuto tenha sido reconhecido, mediante comprovação do mesmo. Também só é possível quando o estatuto seja compatível com a atividade desempenhada e o empregador disponha de recursos e meios para o efeito.
Neste caso, o empregador só pode opor-se ao teletrabalho por razões imperiosas ligadas ao funcionamento da empresa. Para tal, terá de obter um parecer favorável da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego. Se o parecer for desfavorável, a recusa só é possível mediante uma decisão judicial que reconheça razão à entidade patronal.
Como se procede no IRS e despesas adicionais do teletrabalho
As despesas de aquisição ou de utilização de equipamentos necessários para trabalhar são consideradas despesas adicionais. O empregador deve compensar o trabalhador por todas essas despesas, desde que se destinem à realização do trabalho. Estão incluídos os custos de energia, comunicações e respetivas despesas de manutenção.
O Código do Trabalho estabelece que na celebração do acordo de teletrabalho, no contrato de trabalho ou em contrato coletivo, deve fixar-se o valor da compensação devida ao trabalhador. Na ausência dessa fixação, considerar-se-ão despesas adicionais as correspondentes à aquisição de bens ou serviços de que o trabalhador não dispunha antes da celebração do acordo de teletrabalho, bem como as determinadas por comparação com as despesas homólogas do trabalhador no último mês de trabalho em regime presencial.
Contudo, as faturas das despesas adicionais consideradas para reembolso do teletrabalho não têm de ter sido emitidas em nome do trabalhador. Podem ter sido emitidas em nome de outro membro do agregado familiar.
O pagamento da compensação correspondente é devido imediatamente após a realização das despesas. Estas representam um custo para o empregador e não podem ser consideradas rendimento do trabalhador para efeitos de IRS ou de base contributiva para a Segurança Social, até ao limite do valor definido pela portaria em vigor desde 1 de outubro de 2023.